sábado, 13 de agosto de 2011

a dança

começou com rose porto alegre, numa loja fechada da alberto bins, perto do viaduto.
alguém tinha a chave.
a sala era iluminada por velas.
muita poeira e inspiração.
negra lú dançando e giba rocha fotografando.
depois foi a academia muDança, na independencia, fundos.
eva schull, mestre indio.
nikolais, marta graham, jazz e capoeira.
num verão no rio, vi gabriela figueiroa dançar.
mudei pro rio por ela.
algumas aulas depois me perdi na loucura da sobrevivencia na nova cidade (foi foda) e nao sei bem porque migrei para jerry maretzki e cheguei na mariana, linda mariana, que dava aulas no espaço novo de angel e rainer viana. mariana foi dançar no ballet municipal de sao paulo e eu fiquei com rainer muitos anos felizes.
(...)
a dança teve vários sentidos em minha vida.
quando sai de porto alegre, queria voltar para abrir na cidade uma academia de dança livre
(sempre tive sonhos heroicos).
depois dancei só para dançar a vida, coisas dos anos 80.
(...)
aos 51 anos, olhei pro espelho da sala, para a barra, para minha aparencia envelhecida e feliz.
desta vez não têm projetos nem festas. apenas a sensação anônima de estar de volta.

domingo, 19 de junho de 2011

a menina mais bonita da cidade

ana becker era a menina mais bonita da cidade.

e também era muito inteligente, muito sensível. 
sempre foi além de nós, as outras meninas da cidade. 

quando a conheceu, no bonfim, o caio fernando abreu disse que ela parecia uma fadinha. 


a primeira vez que a vi foi no menino deus, onde fazíamos educação física.
[era bem longe da nossa escola, na verdade. eu pegava dois ônibus para chegar. coisas de escola pública]

bem, lá estava eu, em 74, eu acho, quando vejo uma menina linda fazendo baliza.
não de carro! baliza era o que faziam as meninas lindas em frente às bandas de música das escolas.

aninha tinha vindo se santiago, e morava num prédio em frente ao colégio.
nós eramos as duas loiras, as duas usavam óculos redondos como janis joplin e as duas eram ripongas.
ficamos inseparáveis, por longos anos.

um dia chamaram meus pais no colégio: eu fora vista aos beijos no recreio com o hermenegildo
(um cara lindo, inteligente, apaixonado por john lennon e que desenhava muito bem).
claro que não era eu. era aninha quem ele estava beijado...

ela namorou o kiko e eu namorei o keko, irmão dele.
fizemos teatro juntas no grupo "almas e lamas".
e dançamos dançamos dançamos e dançamos juntas na academia mudança.

tomávamos litros de café e fumávamos camel.
eu usava  alfazema garrão, ela também.
ouvíamos roquenrrol.
lagarteávamos na praça da matriz.
escrevíamos diários.
conversávamos.
lemos vários livros de dostoiévski juntas.
viajamos de carona de porto alegre a natal, juntas.
choramos de amor juntas.

um dia aninha saiu pra conhecer o brasil com um namorado jornalista.
porto alegre ficou ainda mais cinza. fui embora pro rio.
depois ela voltou pro sul, depois foi morar na europa, depois voltou pro sul.
eu nunca mais voltei.

tiramos carteira na mesma época, eu em brasília, ela em porto alegre.
tivemos filhos no mesmo ano: eu mathias, ela isabel.

ana é casada com manuel, um fotógrafo perfeito, e mora perto da redenção.
eu sou solteira e moro perto do olhos d´ água.

tenho dezenas de cartas e fotos de ana.
este blog só existe porque ela existe.

hoje ela me ligou e eu pedi pra ela ler o blog.
então sentei aqui e tomei coragem de chegar nos anos 70, finalmente [se a ana deixar].

sexta-feira, 10 de junho de 2011

cadê os anos 70?

os diários dessa década não encontro
só encontrei alguns dos últimos tempos em porto alegre:1980
meio insuportáveis, eu tinha uma paixão burra por um poeta
eu era uma moça estúpida que complicava o amor e não sabia o que fazer do meu 1.74 m de mulher.
eu não sabia onde colocar o desejo [obrigado caetano], muito menos expor meu desejo: eu quero!
[aliás, mudei pouco nesse quesito...].
sobre as cartas : não consegui lê-las, ainda.
é muita viagem abrir essas gavetas.
o poeta que eu amava tinha uns versos sobre isso, sobre procurar cartas e fantasmas nas gavetas.
ele escrevia poemas e eu os ilustrava [aquarelas, claro!] e enviava anonimamente.
eu vivi mesmo isso? nossa, medo.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

anotações meio doidas sobre palestra de sérgio sant'anna (junho de 89, leblon)

[é o que ouvi e anotei. versão  livre de uma fala do sérgio. maravilhoso sérgio. sem garantia de fidedignidade]

Em principio seria para falar de Senhorita Simpson.

Percurso de uma geração.

O que leva uma pessoa a escrever.

Estou com 47 anos. Olho para trás.
Ver a vida.
Retorno.

Com Senhorita Simpson começamos a misturar com geração 68, quando a gente.
Resistência política + percepção estética nova.

Falhou: realismo socialista brasileiro.
Reproduzimos no seu discurso artístico a linguagem do poder.
[até hoje estes escritores se entendem com os generais]

A revolução deles não era a minha
queria viver uma nova realidade
que não era do romance regionalista de 1930

Eramos pessoas que queriam viver a vida.
Apesar de toda repressão era uma época muito libertária em termos pessoais e artísticos.
Zero, do Loyola, rompia com tudo.

Os anos 60 foram tesantes.

Uma nova política terá necessariamente que passar por uma nova linguagem.

Sobre Ralfo: romance de um cara que não sabe escrever romance.
Escrevi bebendo Oswald de Andrade.

Relação falhas/intensidade
Se pintou na sua cabeça com muita força, faça! O resultado a gente vê depois.

Minha literatura está muito ligada as artes plásticas.

Equacionar o universo de uma forma nova.
Como Bob Wilson (teatro).

Qual será a liberdade da década de 90?


 *****

Senhorita Simpson. O pai sou eu. O filho é mais André. [dito para mim depois da palestra].

quarta-feira, 8 de junho de 2011

passagem por brasília em dezembro de 92

como em campo grande
um copo quebrado
o restante foi diferente
o que sobrou de juventude
e violência, o que
faltou de proximidade,
al revés

mas não é bem isso, a vida
de uma mulher

terça-feira, 7 de junho de 2011

no sul, em outubro de 1984

agua tônica no ocidente
perdendo gatinho blue
moet chandon na boite gay
trazendo ninguém

solidão? bobagens meu amor
lugar errado hora errada
pessoas tortas
ou pequeninhas

..........................

caracol: outra vida, mais uma delas.


segunda-feira, 6 de junho de 2011

Esperando Josef Kanaan no Largo do Machado em junho de 1989

21/06/1989

[noite, saindo do IBRAPSI, em Botafogo]

vou pro Estação
depois, vou pegar Kanaan na saída do alemão

ou vou para casa

porque não existe um lugar legal aqui nessa cidade onde eu possa sentar sozinha
e não há táxi que me leve para Santa em paz, sem negociar, sem conversas

acho que sinto falta da tal individualidade que o Da Matta proclama ter encontrado em Notre Dame

............
fui andando até o Estação

não me aproximei do bar
li cartazes
li trechos do Diário de V. Woolf.
vim pro Largo
.......

em frente ao curso de alemão
tem um cara meio morto na calçada
um birosca de cachorro quente
entre nós

foi embora,
uma ambulância
vermelha, enorme, levou

talvez não esteja morto

na livraria
entre títulos e orelhas
cruzam palavras no ar:
facada, morte
(e risos).
................

um casal atravessa a rua
ela, gordinha, de jogging de usar em casa
ele, bermuda, casaco de camuflagem, chinelo adidas e cabelo raspado

vêm reclamar pro PM  que uns caras estavam dando uma de polícia
pra cima de uns pivetes que estavam cheirando alguma coisa na esquinaEditar postagens

a mulher dá um esporro
sai  dando a última palavra "isso é uma vergonha!"
(típico de mulher)

o guarda traga com força a bagana de cigarro e dá de ombros
conversa com um coroa sentado no canteiro (provavelmente bicheiro)

...............

saem do prédio uns garotões (será musculação?)
um fica,
ao lado de uma moto

sai uma menina
bonitinha, com uma pasta, caretinha,
anti-estilo garotão

diz: "achei que você não ia me esperar" ou algo assim
(ele está com ar de desculpas)

dali a pouco ela passa,
sem óculos,
rindo sozinha,
irradiando

olho para o garotão, que sai arrancando com força,  sobre um pedestre:

estava com aquela cara dura
de papelão
que tem os garotões cariocas
não tocados pelas musas